terça-feira, 10 de junho de 2008

Alegria, Alegria: Vida e morte do Tropicalismo

A Tropicália foi o avesso da Bossa Nova

Caetano Veloso

O movimento tropicalista teve início em meados de 1967, mas só passou a carregar este nome a partir de 5 de fevereiro de 1968, quando o jornalista Nelson Motta publicou o artigo “ A Cruzada Tropicalista” no jornal “Última Hora”. O texto falava de um grupo de músicos, cineastas e intelectuais brasileiros que fundava um movimento cultural de alcance internacional.

Cansados do elitismo e do preconceito nacionalista que dominavam o ambiente da música popular brasileira pós- Bossa Nova, um seleto grupo formado por músicos e intelectuais, liderados pelo baiano Caetano Veloso, resolveu após muita discussão arejar o cenário musical do país. A saída para esse marasmo musical seria aproximar a música brasileira dos jovens, que cada vez mais se mostravam seduzidos por ritmos americanos: o pop, o rock dos Beatles e o iê- iê-iê da Jovem Guarda.

O Tropicalismo acabou incorporando elementos da cultura pop estrangeira à cultura brasileira, uma filosofia estética e radical própria da Tropicália, inspirada no movimento antropofágico, idealizado por Oswald de Andrade e outros modernistas na década de 20. Gilberto Gil, Tom Zé, os letristas Torquato Neto e Capinam, o maestro e arranjador Rogério Duprat, o trio Mutantes e as cantoras Gal Costa e Nara Leão também participaram ativamente deste movimento, que, mais do que como um estilo musical, pretendia se impor como uma atitude crítica perante a cena cultural do país.

Canções como Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, e Domingo no Parque, de Gilberto Gil, ficaram conhecidas como marcos oficiais do movimento que, ao longo de 1968, revolucionou o status quo da música popular brasileira. Mas, nem tudo foi flores. As composições, que foram apresentadas ao público no III Festival da Musica Popular Brasileira da TV Record, em outubro de 1967, não foram bem recebidas pela chamada linha dura do movimento estudantil. As guitarras elétricas e a atitude roqueira foi celebradas com vaias e insultos pelos que reconheciam o estilo como símbolo do imperialismo norte-americano. Estavam a partir daí lançadas as bases para o Tropicalismo.

Mas, polêmicas à parte, tanto o júri quanto o grande público do festival aprovou a nova tendência. Domingo no Parque ficou em segundo lugar na competição. Alegria, Alegria terminou em quarto. Mas, o sucesso foi tanto que a música estourou nas rádios de todo país e rendeu a Caetano Veloso mais de 100 mil cópias vendidas, número bastante expressivo para época.

Depois que a Tropicália caiu no gosto do público e na boca da imprensa, já em 1968, Caetano, Gil e os Mutantes viraram verdadeiras celebridades. Com freqüência, eram chamados a participar de programas de televisão, principalmente, àquele apresentado por Abelardo Chacrinha, que virou ícone do movimento.

Em maio do mesmo ano, os tropicalistas gravaram um álbum coletivo chamado Tropicália ou Panis et Circensis. Caetano coordenou o projeto que ficou com cara de de manifesto. Canções inéditas de sua autoria, ao lado de outras de Gil, Torquato Neto, Capinam e Tom Zé faziam parte do trabalho. Os Mutantes, Gal Costa e Nara Leão, além do maestro Rogério Duprat, autor dos arranjos, completavam o time vencedor.



Capa do álbum Tropicália ou Panis et Circensis


O disco foi lançado em agosto e compunha o retrato alegórico de um país ao mesmo tempo moderno e retrógrado. Ritmos como o bolero e o baião, ao lado de canções melodramáticas indicavam o intuito tropicalista de enfatizar a cafonice da cultura brasileira. Afinados com a contracultura da geração hippie, os tropicalistas também questionaram os padrões tradicionais da chamada boa aparência, trocando os cabelos curtos pelos compridos e as roupas sóbrias pelas extravagantes.

Antes de fins sociais e políticos, a Tropicália foi um movimento nitidamente estético e comportamental. Com tantas provocações, as reações à Tropicália começaram a se tornar mais agressivas e os confrontos começaram a aparecer. Dentre os mais famosos está o que ocorreu durante o III Festival Internacional da Canção, no Teatro da Universidade Católica de São Paulo.

Caetano Veloso foi agredido com ovos e tomates pela platéia ao defender com os Mutantes a canção É Proibido Proibir, que compôs a partir de um slogan do movimento estudantil francês. O compositor irado reagiu com um discurso que ficou para a história. "Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?"

Com o crescente endurecimento do regime militar no país, as interferências do Departamento de Censura Federal já eram práticas de rotina. Canções tinham versos inteiros cortados, ou eram mesmo vetadas integralmente. O decretação do Ato Institucional número 5, em 13 de dezembro de 1968, oficializou de vez a repressão política a ativistas e intelectuais.

Em 27 de dezembro de 1968 Caetano e Gil foram detidos e com isso a Tropicália se enfraqueceu, embora a morte simbólica da corrente já tivesse sido decretada em reuniões do grupo. Mas, o movimento que mesclou manifestações tradicionais da cultura brasileira a inovações estéticas radicais da época seguiu influenciando grande parte da música popular produzida no país pelas gerações seguintes.


Postado por: Christiane Dias

Um comentário:

Unknown disse...

parabéns senhorita christiane. Vc é muito gente... Belos comentários, muito bem explorado o tema. Você deve ser uma pessoa muito inteligente.