segunda-feira, 9 de junho de 2008

"2008, O Ano Que Ninguém Quer Estar"

O ano de 2008 se apresenta como sendo o ano de algumas célebres comemorações. Há 40 anos vivíamos o auge da ditadura e seus confrontos com os movimentos estudantis; a Bossa Nova está completando 50 anos de seu nascimento; a obra Macunaíma foi publicada há 80 anos; são 100 anos da morte daquele que é considerado um dos maiores escritores brasileiros: Machado de Assis; 200 anos da vinda da família real para o Brasil; 400 anos da morte de Antônio Vieira e perdoe-nos se esquecemos alguma outra.

Em 1928, Mário de Andrade escreve Macunaíma, que traz uma reflexão sobre a identidade brasileira. Essa obra – que foi chamada por seu autor de rapsódia – virou filme, peça entre outros e por isso pode ser considerada uma das matrizes geradoras da cultura nacional. Também nesse ano, é publicado A Bagaceira, livro de José Américo de Almeida.

A década de 50 é chamada de Anos Dourados e encerrava em si toda uma esperança de que seria possível o país crescer. Juscelino Kubitschek governou de 1956 até 1961 com base em um modelo desenvolvimentista. Assim, teve-se um clima ideal para as vanguardas que influenciaram a poesia de autores de décadas anteriores como Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. Em 1958, a seleção brasileira de futebol se torna, pela primeira vez, campeã mundial, além de ser o ano da Bossa Nova. Por tudo isso, é em 1958 que Joaquim Ferreira dos Santos lança O Ano Que Não Deveria Terminar, em que o autor escreve: “Nunca o brasileiro foi tão feliz como em 1958”.

Devemos destacar também alguns escritores que, em 1958, então em plena atividade: na ficção com Guimarães Rosa, Clarice Lispector; na poesia temos Drummond e João Cabral de Melo Neto etc. Dentre esses, percebemos características interessantes, por exemplo: enquanto Guimarães renova uma tradição na década de 1950 – visto que José de Alencar, Machado de Assis, Lima Barreto são escritores que acreditavam que para se ter ficção era necessário ter uma boa história para contar, uma narrativa – Clarice mostra uma outra corrente de ficção, levando alguns teóricos a não considerar sua ficção como brasileira. O mais importante para a autora de A Paixão segundo G.H. não é o enredo, mas a reflexão sobre os fatos, ao passo que em Guimarães Rosa existe um equilíbrio entre os dois.

O Jornal do Brasil, em 1956, reformula-se e lança um suplemento de poesia que se torna a base do Concretismo e do Neo-Concretismo. Isso se mantém até 1964. João Cabral de Melo Neto, poeta da década de 1940, influenciado por um movimento mineiro de poetas, chamado Violões de Rua, que eram contra o formalismo do concretismo e buscavam uma poesia engajada, embrenha-se na poesia social com Pedra do Sono, Os Três Mal-amados. Mas é com O Engenheiro que ele descobre sua poesia, seu próprio estilo.

Também como um escritor engajado ideológica e politicamente, temos Jorge Amado, que era militante do Partido Comunista. Sendo ele da Bahia, terra do cacau, sua temática não era urbana. Em 1958, Jorge Amado escreve Gabriela, Cravo e Canela. É possível perceber na obra elementos modernos e elementos da virada do século. O autor apresenta nesse livro o fim da impunidade. Antes os maridos matavam suas esposas por adultério e não eram punidos. Há alguma coisa de Machado nessa obra.

Mesclando tradição com modernidade, Jorge Amado usa uma linguagem mais popular, coloca subalternos como personagens relevantes, não que Machado e Alencar não usassem empregados, mas a visão era outra. Tanto Jorge Amado quanto Guimarães Rosa, em 1958, estão preocupados com o arcaísmo; eles retomam um passado, um Brasil que está acabando, um país agrário que dá lugar a um urbano. Esses autores mostram um Brasil da República Velha, um Brasil de coronéis, como se pode ver em Gabriela que se passa na Ilhéus de 1925.

O ano de 1968 faz parte dos chamados Anos de Chumbo e seu lema é: “É proibido proibir”. Nesse ano, na França, tem-se o movimento estudantil na Universidade de Sourbone. Nos Estados Unidos, o movimento será na Universidade da Califórnia com estudantes contra a Guerra do Vietnã. É nesse período que surge o movimento Hippie e a expressão “Paz e Amor” (Make love not war). Podemos dizer que 1968 foi o ano mais próximo da Utopia porque não havia tanta separação entre os mais ricos e mais humildes, visto que estudavam juntos, ou seja, a elite se interessa pelos problemas sociais e políticos. Hoje os filhos da elite estudam fora do Brasil e o número de ricos residentes fora do país é muito maior.

Carlos Drummond de Andrade que em 1930 lança Alguma Poesia, em 1968 escreve sua autobiografia poética: Boitempo. A falta que ama. Nessa obra, tem-se jogos de palavras, trocadilhos como no poema (In) memória. Drummond possui uma fixação na infância, por isso a importância da biografia e da memória. Existe um predomínio do tempo passado sobre o presente. O autor se refugia não mais nas utopias, mas no passado. Ele não se interessa, em 1968, pelo que está acontecendo. Ele fala do avô, de Itabira, do Brasil imperial etc. Boitempo é um poema de um homem de 66 anos que adota, para criar seu poema, uma perspectiva de criança.

Em 1968 tem-se um literatura canônica e outra de massa. Jorge Amado é um escritores dos mais vendidos, obtendo uma grande popularidade. Existe, nesse período, uma retomada da narrativa realista. Graciliano Ramos é herdeiro de Machado.

Diferentemente de autores como Machado, Jorge Amado que valorizam o nacional, a literatura, hoje, fascina ao retratar o outro porque este fascina tanto quanto amedronta. Paulo Coelho, por exemplo, ambienta seus livros em outros países.

Por tudo isso, pode-se dizer que estamos vivendo uma época de memorialismo, pois 2008 é um ano de olhar para o passado. Essa falta de olhar para o futuro é o fim das utopias também chamada de distopia. Esse “olhar para trás” significa um não querer estar no presente. O escritor Zuenir Ventura, autor do livro 1968, O Ano Que Não Terminou, defende a teoria de que 2008 é um ano que ninguém quer estar e, justamente, por conta disso, faz-se tantas comemorações.

Postado por: Achiles Martins Pinto Pereira
Caroline Benarroz de Magalhães
Roberto Pereira da Silva

Um comentário:

Unknown disse...

Muito bem explorado o tema em questão. O título "2008, o ano que ninguém quer estar" é perfeito diante das perspectivas que vivemos. Achiles, Caroline e Roberto estão de parabéns pelo artigo.